Práticas de marginalização e exclusão escolar
«Relembramos seis práticas: elaboração precoce de listagens de incapacidades de alunos, forjando uma catalogação de "alunos de risco", o que vai provocando um progressivo afastamento, institucional e profissional, do aluno concreto e da sua difícil situação real, única e muito premente; recurso permanente à reprovação de ano como uma proeminente estratégia educativa; oferta curricular de mais do mesmo (ex., apoio ao estudo) e de menos do mesmo (ex., currículo adaptado) e muito raramente de algo realmente diferente, construído com cada aluno e adequado à sua "elevação" como pessoa e como cidadão, em torno das suas capacidades; recurso sistemático à punição dos comportamentos disruptivos, o que só os reproduz e aumenta; pressão contínua sobre as famílias e sobre os alunos para que estudem, se esforçem, se empenhem, tenham ambição e gostem da escola, reforçando deste modo a culpabilização dos mesmos. Por outras palavras, dizendo isto, que se diz é que estão mal situados na escola e que esta não tem lugar para eles. Entretanto, estes alunos vão permanecendo na escola discriminados, desqualificados e silenciados porque "inviabilizados na alteridade" (Esteban, 2008, 15), negada que é a sua identidade cidadã, as suas particularidades e diferenças.
(...) É estranho, parece paradoxal, mas é mesmo assim. Produz-se uma operação de cosmética cultural e de reprodução social, em dois movimentos interligados: as profundas desigualdades sociais, as situações de pobreza, de abandono e negligência, as extremas vulnerabilidades são travestidas de problemas escolares dos alunos e de falta de apoio ao estudo por parte das suas famílias; os processos de progressiva marginalização escolar destes alunos, passam por ser naturalizados e considerados como incapacidade de os alunos aproveitarem as oportunidades criadas e, no fim da linha, como "abandono escolar precoce".
(...) julgo que é útil refletirmos profundamente, em cada escola e em cada contexto sociocomunitário (desde logo o município), sobre um conjunto de práticas marginalizadoras e atentatórias da dignidade humana, "contínuas, graduais, empercetíveis e despercebidas", como acima assinalei. Entre elas estão gestos profissionais e práticas institucionais que percorrem tanto o plano físico (por ex., intimidação, gritos, expulsões/suspensões da escola), como psicológicos (por ex., ridicularizações, etiquetagens, menosprezo, ameaças, chantagens) e pedagógico (por ex., escrever n vezes as normas escolares, fazer listagens infindáveis de incapacidades e falhas, coação académica, sobrecarga de trabalhos de casa, recusas em explicar as matérias de novo e de outro modo, invocando falta de tempo).»
Azevedo, J. (2024). Modo de Produção da Exclusão Escolar. Olhar a escola a partir dos excluídos (pp.158-9, 161-2). Vila Nova de Gaia: Fundação Manuel Leão.
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