On ne nait pas femme, on le devient


A expressão (“não nascemos mulheres, tornamo-nos mulheres”) é de Simone de Beauvoir (1908-1986), escritora feminista francesa, e dramatiza a diferença entre sexo e género, que serve hoje para perceber que aquilo que somos (homem ou mulher) depende, em parte, da biologia e da natureza, mas, sobretudo (mais do que nos apercebemos), do processo de socialização a que meninos e meninas estão sujeitos desde que nascem. É-se rapaz ou rapariga, porque se aprendem papéis sociais -- do género masculino diverso do género feminino --, que ditam muito daquilo que cada um vai ser e fazer na vida e que, pior, em quase todas as culturas se superiorizam os primeiros face às segundas. Tais papéis sociais, neste caso de identidade de género, são construídos socialmente e relativos a cada cultura – o que é ser homem ou mulher é aquilo que a sociedade em que estamos inseridos nos inculca. Prova disso, são os múltiplos casos de comparações entre sociedades e culturas diferentes, que atribuem papéis masculinos e femininos muitos diversos ou também de casos de pessoas que procedem a mudanças de sexo.

Diante deste facto descrito e explicado pela Sociologia, a Antropologia e a Psicologia Social, poderemos proceder de duas formas: ou continuamos a perpetuar acriticamente tais construções sociais (no caso da nossa sociedade: os rapazes jogam à bola, as raparigas brincam com bonecas; os rapazes são fortes, as raparigas sensíveis; os rapazes são engenheiros, as raparigas médicas…), incutindo-as nos nossos filhos, e a contribuir para a desigualdade de género, ou então vamos permitindo-nos ouvir as suas preferências próprias, desde tenra idade, preferências essas que serão ditadas por fatores biológicos, genéticos, físicos, mas também por fatores de personalidade e aprendidos do meio e que, de qualquer modo, provêm da sua crescente autonomia na tomada de decisões sobre o que gostam ou não gostam de fazer, estar e ser.

O que está em questão nesta mais recente polémica entre nós sobre discriminação de género (apesar de tudo, tem a virtualidade de colocar as pessoas a pensar e, espero, a informarem-se um pouco sobre a temática) é que há ainda quem tente explicar as diferenças de comportamento entre homens e mulheres a partir, exclusivamente, das diferenças biológicas, defendendo conceções naturalistas, hoje pouco consistentes com os dados das Ciências Sociais. Estas conceções impedem que se veja na criança e jovem alguém, que, sendo uma pessoa, tem a capacidade e o direito de ser o que (for tentando) decidir ser, naturalmente com a orientação dialógica dos pais, mas também dos amigos, professores, vizinhos, personagens dos media…

Os educadores mais conservadores seguram-se ao suposto naturalismo dos papéis sociais, enquanto os mais liberais permitem uma construção identitária mais pessoal, livre e autêntica.

É por isso que as desilusões e incompreensões parentais crescem quando uma rapariga não se tornou uma boa dona-de-casa para jogar futebol ou um rapaz resolveu trocar o rugby pelo design de moda!

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