Por que são ainda necessários professores


Quando o avanço das novas Tecnologias da Informação e da Comunicação permite hoje um amplo acesso facilitado à informação, desde a mais trivial e fútil à produção de conhecimento científico, e permite uma comunicação massiva de pessoas em (quase) todo o mundo, a qualquer momento e para múltiplos fins, fará ainda sentido levar as crianças à escola? Não estará a escola e a própria profissão de professor a tornar-se um anacronismo inútil? A necessidade e a inevitabilidade de aprender, bem como a enorme capacidade e abertura à aprendizagem, que caracterizam o ser humano, são inquestionáveis. Mas, não poderão as crianças e jovens, tal como os adultos, aprender o que precisam, sem ir à escola?

O diretor adjunto de Recherche et devélopment universitaire do IUFM-Midi-Pyrénées (Universidade Toulouse-II), André Tricot, explica por que razão são ainda necessários professores e por que a escola continuará, talvez mais do que nunca, a ser uma instituição social, cultural e antropologicamente demasiado importante:

«(…) Os seres humanos são capazes de aprender quase tudo e mais alguma coisa a partir do momento em que isso faz parte do seu meio e lhes é útil no quotidiano. Podem assim aprender a falar uma segunda língua, a andar de bicicleta, a jogar xadrez, a utilizar um programa de tratamento de texto ou um motor de busca como o Google. A lista é infinita. Esta capacidade de aprendizagem “adaptativa” ou “pela prática” é extraordinária e permite que os seres humanos alcancem níveis muito elevados de desempenho.
(…)
O ensino existe para colmatar os limites desta aprendizagem. Isto porque esta aprendizagem tem um limite importante, que reside na sua própria força: a adaptação. Posso adquirir um alto desempenho em cálculo mental se, por razões profissionais, por razões pessoais, por paixão, por prazer (não importa), praticar o cálculo mental todos os dias. Este é o motor da autodidaxia.

Ora, muitas crianças de 9 anos de idade não praticam o cálculo mental de forma quotidiana, pois não têm nenhuma razão para o fazer, nem ofício ou paixão que implique o cálculo mental. Mas praticam, na escola. Se a escola não existisse, provavelmente a grande maioria das crianças de 9 anos não praticaria o cálculo mental. Não aprenderiam a contar, a escrever, nem provavelmente a ler, a estudar a história do seu país, nem a geografia da Europa, etc. A escola serve para que todas essas crianças aprendam conhecimentos que não correspondem nem aos seus meios imediatos nem às suas paixões. O fulcro do ofício dos professores reside nesta capacidade de ensinarem a todos os seus alunos conhecimentos que não lhes são imediatamente úteis, que não fazem parte dos seus quotidianos, que não os apaixonam de forma particular. (…)

Assim, custa-me a acreditar que se possa dispensar um dia o contacto humano direto, que se possa dispensar as salas de aula e os condicionalismos temporais para assumir esta missão incrível, se compreendermos que esta missão se dirige a todas as crianças e a todos os adolescentes. Estou até inclinado a pensar que, sendo o mundo em que vivemos cada vez mais complexo, rico, diverso e imprevisível, as nossas crianças terão sempre necessidade de mais conhecimentos “não imediatos”, ou seja, de mais escola.»

Tricot, A. (2015). Podemos dispensar os professores? In V. Bedin & M. Fournier (dir.) Aprender (pp. 93-94). Lisboa: Texto & Grafia.

Comentários

Mensagens populares